quarta-feira, 2 de junho de 2010

Relações precosses

A prematuridade do recém-nascido disponibiliza-o para o estabelecimento de relações precoces com quem lhe propicia cuidados parentais. Predispõem-no para o desenvolvimento de competências relacionais com quem dele cuida sob a forma de vinculação.
A Importância da Relação de Vinculação
John Bowlby desenvolveu uma teoria denominada vinculação que é definida pela necessidade de criar e manter relações de proximidade e afectividade com os outros, de o bebé se apegar a outros seres humanos para assegurar protecção e segurança. Segundo ele, para assegurar estas relações existiriam esquemas comportamentais inatos que se manifestariam logo após o nascimento, são eles o choro, o sorriso, agarrar, mamar e seguir com o olhar.
A Investigação de Bowlby
Bolwlby expôs um conjunto de investigações sobre as relações entre as perturbações de comportamento e a história da infância. Combina com a sua investigação os trabalhos de Lorenz, o etólogo que desenvolve o conceito de imprinting. Os recém-nascidos de determinadas espécies fixam a sua preferência relativamente aos indivíduos com quem contactam logo após o nascimento. Geralmente o imprinting dirige-se à mãe ou a outros indivíduos da mesma espécie.
Segundo a teoria da vinculação, estudada por Bowlby e Harlow, a proximidade física do progenitor é uma necessidade inata, primária, essencial ao desenvolvimento mental do ser humano e ao desenvolvimento da sociabilidade.
A partir das concepções de Darwin e dos trabalhos de Lorenz, defende que a vinculação ao progenitores responde a duas necessidades: protecção e socialização.
OUTRAS INVESTIGAÇÕES
Mary Ainsworth foi uma psicóloga que trabalhou com Bowlby e que desenvolveu a teoria da vinculação. Ela considera que existe etapas no processo de vinculação: a um primeiro estádio de orientação, segue-se um estádio de focalização que conduz à vinculação propriamente dita.
Se a relação com os pais gera segurança, a criança sente-se mais livre para descobrir o mundo e estabelecer outras relações. Mary Ainsworth descreve o funcionamento desta “base de segurança” recorrendo a um procedimento experimental – Situação Estranha – em que a criança está com a mãe numa sala e a elas se junta uma pessoa estranha. De seguida sai a mãe e só depois a pessoa estranha, que regressa momentos de pois, antes da mãe. Neste teste a criança brinca confiante na presença da mãe, chora quando ela sai e acalma quando ela regressa. O seu comportamento reflectiria uma vinculação segura.
A partir destas observações distinguiu:
· Vinculação Segura – as crianças choram na ausência da mãe, procurando o contacto físico na sua presença;
· Vinculação Evitante – as crianças parecem indiferentes à separação da mãe, bem como ao seu regresso;
· Vinculação Ambivalente/Resistente – as crianças manifestam ansiedade antes da mãe sair, perturbação na sua ausência, hesitando entre a aproximação e o afastamento dela quando esta regressa.
A investigadora estudou também a relação que a criança estabelece com o pai, utilizando a mesma experiência e constatando os mesmos factos, no entanto com menor intensidade.
APRECIAÇÃO CRÍTICA
· O seu carácter artificial pode conduzir a conclusões desadequadas sobre a relação mãe-filho, razão pela qual os investigadores procuram complementá-la com observações em situações naturais;
· Caracterização do tipo de vinculação encontra-se no contexto particular da sociedade ocidental. Numa situação em que a mãe educa o filho no sentido de uma vinculação evitante, procurando desenvolver a independência do filho, esta fica satisfeita com os resultados, uma vez que, por valorizar a aproximação do filho a outros cuidadores, considera ser este o meio de providenciar segurança e equilíbrio ao seu bebé;
· Os registos culturais e socioeconómicos influenciavam o que consideravam o comportamento desejável para os seus bebés.
As Relações Precoces no tornar-se Humano
Bowlby encarou a vinculação como um comportamento adaptativo da espécie humana. Assim, são as relações de vinculação que tornam previsíveis os comportamentos de resposta às carências.
Da Díade à Tríade
Uma das questões que tem interessado aos investigadores, é como é que da díade – mãe-bebé – se passa para a tríade – mãe-bebé-pai – e depois para os outros grupos sociais.
Os seres humanos são os animais que mantêm laços de relação prolongados no acompanhamento dos seus descendentes, o que implica, complementarmente a outros factores, uma organização social única.
Este tipo de relações tem vindo a alterar-se, concretamente nas sociedades ocidentais, com as grandes mudanças decorrentes da revolução industrial.
Figura de Vinculação
Estudos desenvolvidos mostram que o bebé estabelece laços de vinculação com a pessoa mais próxima e permanente que cuida dele e que responde de forma mais adequada às suas necessidades. Outros cuidadores podem, então, substituir a mãe – agentes maternantes – funcionando como figuras de vinculação.
Na sociedade actual, em que as crianças estão integradas em jardins-de-infância, são favorecidas outras relações que nos permitem falar de vinculações múltiplas, sendo que a mãe não é a única figura de protecção.
Vinculação e equilíbrio Psicológico
O envolvimento físico e emocional que se estabelece permite que a criança cresça equilibradamente para fazer face às necessidades e dificuldades do dia-a-dia. Efectivamente, a mãe, ao interpretar e ao responder satisfatoriamente às necessidades do filho, não só disponibiliza prazer e satisfação no presente, como influência muitos aspectos da sua constituição psicológica.
A relação mãe-bebé contribui, por exemplo, para uma relação mais equilibrada com o corpo, sem tensão nem inibições excessivas, propiciando uma maior proximidade com os outros.
As representações relacionais que se constroem durante a primeira infância contribuem, também para a estruturação da sexualidade. O contacto com a pele, o prazer da fome e da sede saciado, o aconchego do corpo, os odores, constituem elementos importantes na relação que este ser estabelecerá com outros significativos – construção da afectividade.
Vinculação e Individualização
A relação que o bebé estabelece com a pessoa que cuida dele impele-o a explorar o meio e a afastar-se das figuras de vinculação. Isto porque são (à partida) relações de segurança e de confiança, pelo que o bebé/criança/adulto não teme o afastamento dos pais. Este é o princípio do processo de autonomia.
Na base do processo de individualização – necessidade primária de o ser humano criar a sua própria identidade - está, então, a vinculação. Entre estes dois processos existe uma relação de interacção, uma relação dialéctica que se mantém ao longo da vida. A cada etapa de desenvolvimento, apesar de intimamente relacionados, corresponde o predomínio de um dos processos.onsequências das Perturbações nas Relações Precoces
Harry Hallow orientou um conjunto de estudos sobre os macacos que mostraram os efeitos da ausência da mãe junto das crias. Construiu duas mães artificiais, uma de arame e outra “peluche”, sendo que ambas providenciavam alimento de igual qualidade. O investigador constatou que as crias passavam a maior parte do tempo agarradas à mãe de peluche, não procurando a mãe de arame para se proteger numa situação de perigo.
Noutro estudo procurou avaliar o efeito nos macaquinhos criados sem qualquer contacto, isolando-os numa jaula vazia, sem ver qualquer ser vivo. Quando os períodos eram longos os macacos encostavam-se ao fundo da jaula balouçando-se para trás e para a frente e agarrando-se a si próprios. Quando juntos a outros macacos ditos normais, não participavam em qualquer brincadeira, fugindo de contactos. Quando adultos o seu comportamento sexual estava fortemente afectado bem como a sua capacidade de criar os seus bebés, chegando a maltratá-los.
Com estas experiências concluiu que o vínculo entre a cria e a mãe estaria mais relacionado com o contacto corporal e o conforto daí decorrente do que com a alimentação, e que são devastadores os efeitos da ausência da mãe, também nos humanos.
O Hospitalismo
René Spitz, psiquiatra infantil, desenvolveu um conjunto de pesquisas em crianças que permaneceram num orfanato, durante os primeiros 12 meses de vida, privadas da presença da mãe. Estou as consequências e concluiu que os bebés apresentavam perturbações somáticas e psíquicas, já que os cuidados são administrados de forma anónima, sem que se estabeleçam laços afectivos.
Spitz designou por hospitalismo o conjunto de perturbações vividas por crianças institucionalizadas e privadas de cuidados maternos: atrasos no desenvolvimento corporal, dificuldades na habilidade manual e na adaptação ao meio ambiente e atraso na linguagem. São crianças menos resistentes às doenças e que, nos casos mais graves, podem ser apáticas. Os efeitos destas perturbações são duradouros e muitas vezes irreversíveis.
Com as suas investigações, o psiquiatra confirmou a necessidade de laços e de contactos afectivos entre o bebé e o adulto.


Relações Precoces – Caracterização
Publicada por Joana Pereira on 19:11 / Comments: (0) Etiquetas: , , , ,
O ser humano é um ser biologicamente social, já que desde que nasce até que morre vive integrado num meio social. Só sobrevive porque vive em interacção com outros que contribuem para o seu bem-estar físico e psicológico. Precisamos que gostem de nós, que nos aprovem, e de nos sentir integrados. Somos, então, dependentes uns dos outros.
A vocação social manifesta-se logo após o nascimento nas relações precoces que o bebé estabelece com a mãe e com os adultos que cuidam de si. É na relação com os outros que o nosso eu se constrói.

A Imaturidade do Bebé Humano
A imaturidade do ser humano, que torna o bebé dependente de adultos para sobreviver, revelou-se um elemento decisivo no processo de desenvolvimento da espécie. Esta imaturidade, e as necessidades daí decorrentes, implicam relações com os progenitores distintas dos outros seres vivos.
As Competências Básicas do Bebé
Os novos meios de investigação, e os novos dados que se obtiveram, originaram um interesse singular pelas competências precoces do bebé, sendo também crescente a consciência da importância que tem o conhecimento da psicologia do bebé na compreensão do desenvolvimento humano e no modo como se processa a comunicação com as figuras parentais. Abandonou-se a ideia de que um bebé era um ser passivo e constatou-se que, na verdade, apresenta um conjunto de capacidades e competências que estimulam aqueles que o rodeiam a satisfazê-lo – capacidade para comunicar.
Competências para Comunicar
A comunicação entre o bebé e as figuras parentais faz-se através de um conjunto de sinais que manifestam as suas necessidades e o seu estado emocional – regulação mútua.
Estudos recentes provam que o bebé, enquanto sujeito activo que se expressa e reage à atenção disponibilizada, é capaz de dirigir a sua atenção para estímulos do meio, como vozes e cores, logo que nasce. O choro, o contacto físico, o sorriso, as expressões faciais, as vocalizações são alguns dos meios a que o bebé recorre para manifestar as suas necessidades e obter a sua satisfação. São, também, estratégias para seduzir os adultos, de forma a evitar que os abandonem.
O SORRISO
O sorriso é uma das formas de comunicação que desencadeia confiança e afecto reforçando os esforços dos adultos em satisfazer o seu bebé.
Os sorrisos dos bebés começam por ser reflexivos e/ou automáticos, por exemplo quando acabam de comer. Mais tarde tornam-se intencionais, sorrindo não apenas para a mãe mas para qualquer rosto que surja. Por volta dos seis meses apenas sorriem para as pessoas que conhecem, sendo um sorriso social.
O CHORO
O choro é o meio mais eficaz de demonstrar uma necessidade ou um mal-estar. As crianças cujas mães não respondem imediatamente aos apelos tendem a chorar com frequência durante o primeiro ano de vida. As crianças cujas mães são solícitas no atendimento ao choro tendem a chorar menos, desenvolvendo outras formas de apelar, pois introduz nas crianças um estado de segurança. Daí que outras formas de comunicação se desenvolvam rapidamente em substituição do choro.
Podem distinguir-se quatro padrões de choro: choro básico de fome, choro de raiva, choro de frustração e choro de dor. As figuras parentais, em geral, sabem distingui-los, o que lhes permite responder às solicitações.

AS EXPRESSÕES FACIAIS
A tristeza, o medo, a raiva e a surpresa, são emoções que se podem manifestar através de expressões faciais. Psicólogos como Carroll Izard procuraram identificar, no bebé, as expressões manifestadas e as emoções correspondentes, filmando brincadeiras diferentes, como um palhaço a saltar de uma caixa.
As expressões faciais têm um valor comunicacional porque transitem uma mensagem que tem expectativa de uma resposta.
AS VOCALIZAÇÕES
Os bebés desde muito cedo emitem sons vocais como resposta às vocalizações dos adultos – Lalação. É caracterizado, fundamentalmente, por cadeias de sílabas repetitivas: ta ta ta, pa pa pa…
As vocalizações que vão evoluindo para forma de conversa são um reforço para a atenção dispensada pelos adultos.
As Competências da Mãe
Uma interacção equilibrada exige que a mãe interprete adequadamente os sinais emitidos pelo bebé e que responda de forma apropriada. Se o bebé obtém o que precisa, reagirá com alegria; se, depois de várias tentativas para atrair a mãe, não consegue, manifestará ansiedade e frustração.
Entre o nascimento e os 18 meses, o bebé mantém uma relação privilegiada com a mãe, que oscila entre confiança e desconfiança. Se a mãe cuida do bebé, se está disponível para responder às suas solicitações, desenvolve um sentimento de confiança fazendo-o sentir seguro. Caso a mãe não responda adequadamente, podem desenvolver-se sentimentos de desconfiança. Segundo Erikson, a confiança reflectir-se-ia ao longo da via, manifestando-se numa capacidade de adaptação às pessoas e às situações em contexto social.
A sensibilidade e a disponibilidade da mãe face às necessidades do bebé e o prazer mútuo nas interacções que se estabelecem propiciam um sentimento interno de segurança, que é gerador de uma confiança básica que permite ao bebé encarar o mundo de forma positiva. A qualidade da relação entre a mãe e o bebé é, assim, importante, para o desenvolvimento da personalidade, da autoconfiança.
Segundo o modelo continente-conteúdo de Bion, a mãe pode ser a depositária dos sentimentos contraditórios do seu filho. Face à ansiedade do bebé, este psicanalista sugere três possibilidades de actuação da mãe:
· Interpreta-a como uma manha perturbadora, agudizando a ansiedade – como a mãe não se liga ao bebé não é continente;
· Fica tão alarmada que desenvolve comportamentos ansiosos de sobreprotecção – excede-se em agitação transmitindo ainda mais angústia para o bebé, não é uma mãe continente;
· Reage às necessidades do bebé dando acolhimento à angústia e à ansiedade do filho sem as desenvolver – transmite equilíbrio psicológico
As Fantasias da Mãe
A relação mãe/bebé inicia-se quando a mulher tem conhecimento da sua gravidez. Esta relação é construída e reforçada pelas fantasias da mãe face ao bebé. As fantasias são um conjunto de suposições sobre o sexo do bebé, com quem será parecido, como se comportará. Fazem-se projectos relativamente à criança. Estas fantasias fazem com que muitas mulheres falem com o seu bebé, construindo-se, assim, um vínculo a um bebé imaginário que terá de dar lugar ao bebé real.

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