quarta-feira, 2 de junho de 2010

As emoções


Até à algum tempo atrás as emoções eram vistas como um entrave do modo de pensar e agir, por serem irracionais. No entanto, devido a investigações levadas a caso, entre outros, por António Damásio, o seu estatuto foi alterado, sendo que, actualmente, são consideradas fundamentais no acto de decidir, por representarem processos com valor adaptativo (são sinalizadoras de determinados estados.
É muito difícil esconder as nossas emoções, uma vez que comunicamos o que estamos a sentir por um torcer de mãos e uma alteração do tom de voz, por exemplo. Assim podemos afirmar que as emoções estão presentes nas nossas interacções sociais, acompanhando ou até mesmo substituindo a linguagem. Como? Através de sinais emocionais, como por exemplo o sorriso e o choro, que, após uma interpretação, originam uma resposta. Esta comunicação acaba por ser muito mais rápida e poderosa.
A complexidade das emoções reside no significado que atribuímos às pessoas, aos acontecimentos e aos lugares, que depende dos nossos valores, princípios e da nossa história pessoal.
Outro contributo importante de Damásio foi a classificação das emoções, distinguindo diferentes tipos:
- Emoções primárias ou universais – surgem na infância com o intuito de reagir rapidamente a diferentes estímulos – alegria, tristeza, medo, surpresa,...
- Emoções secundárias ou sociais – constituem-se por cima das primárias, experimentando-se mais tarde. Implicam uma avaliação cognitiva das situações e o recurso a aprendizagens feitas (córtex pré-frontal) - vergonha, ciúme, culpa, orgulho,...
- Emoções de fundo – bem ou mal-estar, calma ou tensão,...
Para as distinguir dos afectos e sentimentos, eis as características que melhor os definem:
Emoções:
- Tem origem numa causa, num objecto;
- São reacções corporais específicas, observáveis;
- São publicas e voltadas para o exterior;
- São automáticas e inconscientes;
- Polaridade: podem ser negativas ou positivas;
- São versáteis: variam em intensidade e são de breve duração;
- Relacionam-se com o tempo: as emoções têm princípio e fim.
Afectos:
- Os afectos têm a ver com aquilo que nos afecta, são algo de que somos dotados;
- São tendências para responder positiva ou negativamente a experiências emocionais relacionadas com as pessoas ou objectos;
- Ter afectos é ser dotado da capacidade de dar e de receber, de amar e de ser amado, de perturbar e de ser perturbado, por exemplo;
- Os afectos exprimem-se através das emoções e têm uma ligação especial com o passado, com as experiências e vivências com as pessoas, objectos, ambientes e ideias. As emoções estão ligadas essencialmente a situações presentes;
- Exprimem-se em sentimentos e emoções.
Sentimentos:
- Não são observáveis, são privados e relacionam-se com o interior;
- Prolongam-se no tempo e são de menor intensidade de expressão que as emoções;
- Não se associam a nenhuma causa imediata;
- Surgem quando tomamos consciência das nossas emoções.
Normalmente, emoção e sentimento surgem como sinónimos, mas segundo António Damásio, a relação entre ambos é muito estreita. A emoção é um conjunto de reacções corporais, automáticas e inconscientes, face a determinados estímulos provenientes do meio onde estamos inseridos. O sentimento surge quando tomamos consciência das nossas emoções, isto é, o sentimento dá-se quando as nossas emoções são transferidas para determinadas zonas do nosso cérebro, onde são codificadas sob a forma de actividade neuronal.
Não é inerente aos sentimentos termos consciência deles, razão pela qual António Damásio considera que existem 3 fases:
- O estado de emoção – a emoção pode ser desencadeada e experimentada de forma inconsciente;
- O estado de sentimento – pode ser representado de uma forma não consciente;
- O estado de sentimento formado consciente – conhecido pelo organismo que experimenta a emoção e o sentimento.
Componentes das Emoções
- Componente cognitiva - Ocorre quando tomamos conhecimento do facto: se não houver conhecimento deste, não se experimenta qualquer emoção;
- Componente avaliativa - Fazemos uma avaliação, agradável ou desagradável, da situação;
- Componente fisiológica - Manifestações orgânicas, corporais face à emoção;
- Componente expressiva - Expressões corporais que permitem mostrar ao outro as nossas emoções;
- Componente comportamental - Comportamento que o sujeito poderá ter face ao outro, é o estado emocional que desencadeia determinado conjunto de comportamentos;
- Componente subjectiva - Relaciona-se com o que o indivíduo sente a nível emocional e interior a que só ele tem acesso, ou seja, é o estado afectivo associado à emoção.
A emoção não se pode resumir a nenhuma destas componentes, sendo que uma influência todas as outras.
Perspectivas sobre as Emoções
Perspectiva Evolutiva
Charles Darwin procurou traços comuns na expressão de emoções em vários povos, e identificou seis emoções primárias: a alegria, a tristeza, a surpresa, a cólera, o desgosto e o medo. Considerou que as emoções têm um papel adaptativo fundamental na história da espécie humana, sendo determinante para a sua capacidade de sobrevivência.
Mais tarde, Paul Ekman procurou testar uma tese que defendia que povos diferentes teriam emoções diferentes. Utilizou fotografias de norte-americanos a interpretar as seis emoções primárias, para questionar o povo Foré e apurar se conseguiam identificá-las. Acabou por confirmar a tese de Darwin: há emoções que são universais, independentes do processo de aprendizagem e da cultura em que se manifesta. Não nega a influência da cultura nas emoções, na medida em que há regras que controlam a sua expressão. Porem, existe um património comum ao nível das emoções e da sua expressão.
Perspectiva Fisiológica
Defendida por Willians James, que considerava que as emoções resultariam da consciência das mudanças orgânicas provocadas por determinados estímulos. Assim, numa situação de perigo eu tenho medo porque fujo e não ao contrário. Tomo consciência das pernas a tremer, da respiração ofegante,..., o que me faz sentir medo. As emoções resultam das percepções do estado do corpo, das mudanças orgânicas oprovocadas por estímulos. O estado de consciência de emoções como a cólera, a alegria, a raiva, resume-se à consciência de manifestações fisiológicas. Um aspecto positivo da sua teoria, foi ter considerado que a emoção é um estado subjectivo e ter mostrado o interesse do estudo das emoções.
Perspectiva Cognitivista
Afirmam que os processos cognitivos, como as percepções, recordações e aprendizagens, são fundamentais para se perceberem as emoções. É o modo como interpreto determinada situação e a avalio segundo a minha história pessoal, que provoca a emoção.
Perspectiva Culturalista
As emoções são processos aprendidos no processo de socialização. As emoções são uma construção social, como tal têm que ser aprendidas. As diferentes sociedades e culturas definem o tipo de emoções que se podem manifestar e como as manifestar. A sua forma de expressão varia de cultura para cultura, dependendo assim do espaço e do tempo. Nega a existência de emoções universais: à diversidade cultural corresponde uma diversidade de emoções e das respectivas expressões.
Razão e Emoção
As pesquisas levadas a cabo por Damásio, referentes às áreas pré-frontais do cérebro, em que analisou vários casos de doentes com lesões, provocados por acidentes vasculares cerebrais, tumores ou traumatismo craniano, lesões estas que provocavam uma modificação na capacidade de decidir, especialmente em situações de caracter pessoal e social que envolvem risco e conflito, levaram-no a concluir que as emoções eram importantes na tomada de decisão. Assim, quando temos de tomar uma dceisão é preciso:
- Ter conhecimento da situação;
- Conhecer as diferentes opções de acção;
- Conhecer as consequências dessas acções no presente futuro.
A análise rigorosa de cada uma das hipóteses levaria tanto tempo que a opção escolhida deixaria de ser oportuna, ou então, perder-nos-íamos nos cálculos das vantagens e das desvantagens. Segundo o próprio autor, “a emoção bem dirigida parece ser o sistema de apoio sem o qual o edifício da razão não pode funcionar eficazmente”.
A tomada de decisão é suportada por duas vias complementares:
- Representação das consequências de uma opção disponibilizada pelo raciocínio: avaliação da situação, levantamento das opções possíveis, comparações lógicas, etc.;
- A percepção da situação provoca a activação de experiências emocionais experimentadas anteriormente em situações semelhantes.
Marcador somático: mecanismo automático que suporta as nossas decisões. Permite-nos decidir eficientemente num curto intervalo de tempo. Actua como um sinal de alarme automático que diz: atenção ao perigo decorrente da escolha de determinada acção. Este sinal protege-nos de prejuízos futuros, sem mais hesitações, permitindo-nos escolher uma alternativa entre as várias. Os marcadores somáticos aumentam provavelmente a precisão e a eficiência do processo de decisão.

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